Falando em atraso, eu publiquei este texto no meu blog em 2008, mas vale a pena relembrar:
Companheiros de estrada
Há alguns
dias,conversando com um amigo no chat motonline, ele relatava-me uma viagem
recém-realizada pela sua turma. No seu relato pude perceber que o passeio
daquele grupo não trazia boas lembranças, pelo contrário, continha mais
dissabores do que diversão e prazer propriamente
ditos.
Pelo seu
relato os desentendimentos começaram antes mesmo da partida, que havia sido
marcada para as 07:30 horas da manhã e a despeito de tudo que havia sido
combinado em reuniões preliminares com todos os candidatos a viajante, chegou a
hora da partida e alguns confirmados não apareceram. Ao ligar para seus
celulares souberam que os “amigos” ainda estavam em casa, dormindo, evidenciando
total desrespeito com seus futuros colegas de estrada. No final, acabaram saindo
às 9 horas, uns bronqueados com os outros o que desencadeou novos acontecimentos
desagradáveis no percurso, mas não os abordarei por serem irrelevantes ao tema
deste texto.
Viajar de moto
proporciona um prazer indescritível que somente é superado quando na viagem você
está acompanhado daqueles amigos que você preza, respeita e goza da mesma
reciprocidade de sentimentos.
Só que, até
você chegar à conclusão de que determinada pessoa merece o título de “seu
amigo”, é uma tarefa demorada de observação e lapidação das arestas
complicadoras do relacionamento.
O mais comum é
encontrar comportamentos displicentes e desinteressados e porisso é muito
difícil achar companheiros perfeitos para viagens, quer sejam aquelas breves, de
final de semana, ou aquelas mais longas, que demandam maior cumplicidade e
preparação. Comum é
encontrarmos companheiros de uma única viagem, por vários
motivos.
Nem sempre os
gostos combinam; um gosta de correr mais e se incomoda de manter o rítmo do
grupo, não se importando em perder o convívio silencioso da estrada e a alegria
de ver o outro à sua frente ou pelo espelho retrovisor; outro tem mais poder
aquisitivo e não se sujeita a acampar ou frequentar hotéis e restaurantes mais
modestos e adequados ao bolso do restante da turma; outros não gostam de parar
para apreciar as coisas bonitas da estrada, e o pior, alguns não dão o
necessário auxílio quando alguma das motos quebra no meio da viagem. Enfim,
várias coisas conspiram contra quando se busca achar os companheiros ideais, tal
qual achar uma namorada em condições de tornar-se esposa. Só depois de muitas
viagens, muitas tentativas, se tiver sorte, dá pra escolher parceiros fixos, que
realmente sejam companheiros e confiáveis, que haja um mínimo de sintonia de
gostos de uma maneira geral. Exigir a perfeição seria querer demais.
Mesmo assim,
com os passeios e viagens se sucedendo, ainda é preciso ir trabalhando as
relações, um cedendo daqui, o outro cedendo de lá e aos poucos cria-se uma
convivência agradável e duradoura, que trará benefícios mútuos e ainda deixará
muitas fotografias e momentos para relembrar com satisfação e alimentar a
expectativa da próxima oportunidade de renovar e fortalecer esses laços de
amizade. Comum ver relatos de amizades que nascem dessa forma e duram uma vida
inteira, transportando-se da estrada para a convivência
familiar.
Sempre gostei
de viajar em grupo, por prazer e até por segurança no caso de quebra da moto ou
até mesmo um pneu furado no meio do nada, mas às vezes as agendas são
inconciliáveis e quando você pode viajar eles não podem ou quando eles podem,
você é que está ferrado no trabalho ou noutro compromisso, sem possibilidade de
acompanhar a turma e acaba ficando em casa na maior
vontade.
Mesmo quando
viajo só, sinto que nunca estou realmente sozinho pois a moto, apesar de tão
discriminada, atrai as demais pessoas e desperta nelas admiração e um pouco de
inveja sadia pela sensação de liberdade que ela transmite. Seja lá onde for que
se pare, sempre há oportunidade de conversar com pessoas e outros motociclistas
que a gente encontra pelo caminho.
Certa vez,
numa parada para abastecimento num posto de gasolina da BR-116, no Estado de
Santa Catarina, encontrei o Comandante Rolim (da TAM), também motociclista
solitário indo de encontro aos seus amigos que o aguardavam em Porto Alegre para
de lá seguirem em grupo para o Chile. Se ambos estivéssemos de carro, nem
teríamos nos olhado e sequer aproveitado aquela meia hora fantástica que ficamos
batendo papo. Nem preciso dizer qual foi o assunto que norteou nossa conversa.
Numa outra ocasião,
viajando sozinho, encontrei uma turma com perto de 35 motos pequenas, de um
motoclube de outra cidade, e os acompanhei por um bom trecho de estrada, até que
nossos destinos se separaram por estradas diferentes. Por muito tempo “troquei
idéias” com alguns deles por e-mail.
Em ambos os
casos, se morássemos na mesma cidade, talvez até pegássemos alguma estrada
juntos e nascesse desse encontro ocasional, uma sólida relação de amizade e
companheirismo.
É como diz a
letra da música Canção da América: “Amigo é coisa pra se guardar debaixo de
sete chaves dentro do coração”. Dado o trabalho que dá fazer novos amigos de
estrada, diria que é muito verdadeira essa feliz afirmação do Milton Nascimento